O que as prefeituras podem fazer agora: da prevenção ao tratamento para Covid-19
Participantes
Profa. Marcia Castro – Chefe do Departamento de Saúde Global da Universidade de Harvard (EUA)
Prof. Aluisio Segurado – Ala Covid-19 do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (HC-USP)
Vídeo
- Publicado em 03/06/2020
No momento em que muitos municípios brasileiros começam a avaliar a reabertura de serviços, após um período de medidas restritivas na resposta à Covid-19, o Diálogos CoronaCidades promoveu um encontro online com dois dos maiores especialistas em Covid-19 do país.
Márcia Castro, chefe do Departamento de Saúde Global da Universidade de Harvard, e Aluisio Segurado, Ala Covid-19 do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (HC-USP), debateram por mais de uma hora, para um público de gestores públicos de todo o Brasil, sobre como as prefeituras podem planejar os próximos passos de resposta ao coronavírus, da prevenção ao tratamento.
Durante o encontro, os convidados explicaram que economia e saúde andam juntas, destacaram como a estrutura de saúde da família, que integra o SUS, pode auxiliar no controle da Covid-19 e reforçaram a importância da testagem e do rastreamento para a resposta ao coronavírus. “Tem que monitorar sintomas e rastrear contato. Sem isso, vai dar problema”, alertou Márcia Castro.
Assista ao encontro na íntegra no vídeo e leia um resumo da discussão logo abaixo.
Estrutura do SUS pode contribuir com o rastreamento
Para promover uma reabertura mais segura, é importante que os municípios que já têm circulação de coronavírus tenham capacidade de identificar sintomas e rastrear novos casos para conter a propagação do vírus e reduzir a chance de uma nova onda de contágios.
Em outros lugares do mundo, como nos Estados Unidos, as autoridades públicas buscaram voluntários que pudessem atuar como detetives Covid-19, ajudando a rastrear novos casos e reduzindo o ritmo de contágio da doença. No Diálogos CoronaCidades, Márcia Castro destacou que o Brasil já conta com um contingente de profissionais com conhecimento e capacidade de auxiliar nesse processo: os agentes comunitários de saúde da família.
“Não estamos usando parte da rede de atenção que já dispomos, com os agentes comunitários de saúde. Com equipamentos de proteção e treinamento adequado, eles poderiam ajudar muito no rastreamento de contatos. Nós temos uma legião de detetives que não são usados como deveriam”, destacou Márcia, que lidera o departamento de Global Health and Population de Harvard.
Responsável pela Ala Covid-19 do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (HC-USP), o médico Aluisio Segurado reforçou a importância de os municípios utilizarem todas as ferramentas possíveis para a resposta ao coronavírus. “É preciso lançar mão de todas as ferramentas disponíveis: a testagem ampla, o rastreamento de contatos”, elencou o especialista. “Não dá para esperar que a epidemia se resolva espontaneamente”, complementou.
O pico da curva é diferente para cada município
Muito se fala sobre quando o Brasil vai alcançar o pico da curva de contágio por coronavírus. No Diálogos CoronaCidades, os participantes reforçaram a grandiosidade do país e a impossibilidade de avaliar o cenário a partir de uma curva única.
Márcia Castro reforçou que os modelos são importantes, mas não são suficientes para cravar uma data para o pico de contágio. A curva está em constante transformação. “É mais importante descrever qual é a trajetória, porque os números mudam e há uma incerteza. O Brasil é muito grande e, se você quebra a curva por estado, vai ver que cada um está em um lugar”, explicou a especialista.
< Acesse o Farol Covid e avalie o cenário do seu município >
Saúde e economia andam juntas
Os participantes também abordaram a falsa dicotomia entre saúde e economia e sugeriram abordagens que a comunicação municipal pode adotar para esclarecer o assunto para a população.
O médico Aluisio Segurado afirmou que o que causa a crise econômica é a pandemia e isso precisa ser destacado. “Isso é em todos os países do mundo, onde se fez ou não se fez distanciamento social. Tenta-se apresentar a noção de que é o fechamento das atividades econômicas que está trazendo a crise, é importante desfazer essa ideia. A crise econômica virá para o mundo todo, é global e temos que estar vivos para poder superá-la”, resumiu.
Márcia Castro afirmou que não existe crescimento econômico possível quando os trabalhadores estão doentes. “Saúde e economia não são duas caixas separadas, elas andam juntas. Um capital humano que não esteja saudável e esteja morrendo não vai levar ao desenvolvimento. Não dá para dissociar”, afirmou.
Mesmo sem coordenação federal, municípios podem se articular
Um dos aspectos abordados ao longo de todo o Diálogos CoronaCidades foi a dificuldade que os municípios enfrentam diante da ausência de uma coordenação federal que ajude a orientar a resposta ao coronavírus. Mesmo diante do cenário, os participantes destacaram a necessidade de que os municípios busquem formas de articulação, especialmente quando há uma grande mobilidade de pessoas dentro da mesma região.
“Uma região metropolitana tem que pensar em todos os municípios do entorno, já que existe uma ampla mobilidade entre cidade polo e cidades vizinhas”, destacou Aluisio Segurado. Os pontos de atenção são diferentes em cada região, mas devem ser analisados conjuntamente pelos municípios. O médico lembrou a situação do Amazonas, em que o transporte via barco acabou se tornando um facilitador do contágio da população. “O transporte fluvial acabou se mostrando um vetor enorme de disseminação naquele território”, disse.
< Assista ao Diálogos CoronaCidades sobre como enfrentar a pandemia nos pequenos municípios >
Estratégias para manter a atenção básica e o tratamento da Covid-19
Responsável pela Ala Covid do Hospital das Clínicas, Aluisio Segurado compartilhou com os participantes do Diálogos CoronaCidades o desafio de planejar a resposta ao Covid-19 sem abrir mão da atenção básica à saúde.
“Nós instalamos nosso comitê de crise em janeiro de 2020, mais de um mês antes do primeiro caso confirmado no Brasil. Quando a transmissão comunitária foi declarada em São Paulo e foi migrando para segmentos mais dependentes do SUS, nós já tínhamos nos preparado”, resumiu Segurado.
No caso do HC, a solução encontrada para evitar a contaminação cruzada e manter a atenção básica foi isolar um dos prédios do complexo hospitalar para dedicar só ao atendimento de pacientes de Covid-19, mas a partir da sua estrutura e realidade, cada município precisa encontrar a melhor solução.
< Assista ao Diálogos CoronaCidades sobre como organizar a atenção básica em saúde >
Municípios menores, que ainda não têm transmissão comunitária do vírus, têm a oportunidade de planejar a resposta ao coronavírus, utilizando o conhecimento acumulado em outras experiências no país, inclusive, em relação aos protocolos de tratamento. “Não temos medicamento eficaz que mude o curso da doença, mas aprendemos o manejo do caso. É uma infecção viral, mesmo que não haja medicamento específico, por enquanto, para combater esse vírus, as medidas de suporte são importantes e hoje nós sabemos tratar melhor quem está na UTI”, afirmou o médico.
Assista à íntegra do Diálogos CoronaCidades no vídeo.